Pastoral Afro-brasileira e o enfrentamento do racismo

Nas últimas meses, nesse tempo ainda de pandemia, fomos impactados com os cruéis e inadmissíveis atos de violência contra nossos irmãos afro-brasileiros.

Isso exige dos cristãos e de todos os cidadãos um firme repúdio no caminho da justiça e da paz. E para isso é importante fazer a recordação da história dos negros do Brasil.

Destaco a contribuição da Pastoral Afro-brasileira no enfrentamento dessa sociedade que fez a opção econômica pelo escravagismo buscando um conjunto de justificativas para tal orientação.

As justificativas da escravidão, de origem filosófica, biológica e até mesmo teológica, geraram uma orientação preconceituosa e discriminatória em relação à cultura dos povos oriundos da África.

Sabemos que a Igreja encontrou dificuldades em apontar um outro caminho. Afinal o projeto colonial embasado na economia escravagista foi hegemônico. Não teria durado três séculos se tivesse enfrentado uma resistência mais consistente.

A Igreja não o questionou de uma forma incisiva e em diversas situações compactuou com a escravidão.

Um exemplo desta dificuldade: ainda hoje há poucas vocações sacerdotais e religiosas oriundas da cultura afro-brasileira.

A nossa diocese é uma das poucas exceções com o bispo e cinco padres negros. Há uma causa histórica para esta dificuldade.

Não há como negar certo estranhamento entre os afro-brasileiros e a Igreja, mesmo que os negros tenham sido os primeiros batizados do continente latino-americano e do Brasil.

Entretanto, se percebe também, no passado e hoje, muitas iniciativas da Igreja, de apoio, reconhecimento e solidariedade à caminhada dos negros em terras brasileiras.

Tais iniciativas estão em sintonia com compromisso do missionário Pedro Claver, o santo que se fez negro no meio dos negros.

O próprio Zumbi dos Palmares foi acolhido por um padre que o educou até a juventude. Os Franciscanos do Rio de Janeiro acolhiam escravos idosos impossibilitados de trabalhar.

Ao menos tinham uma morte digna. Muitos bispos e padres, ao seu modo, procuraram ajudar os negros e negras escravizados.

Vê-se que Igreja procurou arrefecer, mesmo sem o questionar de forma incisiva, o impacto do projeto escravagista sobre os negros. As iniciativas de apoio aos negros foram constantes.

No século passado a Conferência de Puebla (1979) sugeria à Igreja o compromisso para com os negros, pois ali era visto também o rosto de Cristo sofredor.

A Conferência de Santo Domingo (1992), com atenção especial voltada às culturas presentes no Continente Latino Americano, dedicou atenção à situação dos afro-americanos.

O documento Ecclesia in América também reforça o compromisso para com os afro-americanos e sugere o desafio da formação de agentes de pastoral competentes capazes de fazer uso de métodos já legitimamente inculturados na catequese e na liturgia. Tal orientação também faz referência aos povos indígenas.

Com o dizia o profeta Isaías (Is11, 1s), há um broto nascendo e que nos faz acreditar na vida. No caso dos afro-brasileiros existiram muitos brotos.

Estes brotos, porque cuidados e amados, geraram plantas, projetos, deram um aporte para a cidadania civil e eclesial reivindicadas pelos negros.

As referidas Conferências de Medellín (1968), Puebla, Santo Domingo (1992) e mais recentemente Aparecida, aconteceram pelo sopro do Espírito, iluminaram o compromisso efetivo da Igreja como o povo latino americano.

Este compromisso foi assumido também em relação ao povo negro e permanece no horizonte evangelizador da Igreja. Era o alimento necessário para os brotos que surgiam, a renovação diversa e ampla como inspirou o Espírito Santo (At 2, 1ss).

A realidade social nos desafia ao anúncio da Boa Notícia, nesta sociedade onde impera a violência, o desemprego, a fome, o analfabetismo, a perda da identidade, tendo como resultado a exclusão, a esperança ameaçada.

As vítimas desta realidade difícil, em sua maioria são os negros. Frente ao racismo que assistimos nos últimos tempos, creditamos teimosamente na concretização do sonho de uma sociedade livre, sem escravos e nem senhores, onde todos são tratados com igualdade, onde todos participam.

O Projeto da Pastoral afro-brasileira é uma proposta de construção da cidadania plena para todos. A pastoral é compreendida como zelo apostólico para como o povo, sobretudo para com os povos pobres e os abandonados.

Assim, as diversas iniciativas dos negros católicos encontram na pastoral afro-brasileira um espaço de reflexão, articulação e diálogo voltados para a vivacidade e dinamicidade da ação evangelizadora da Igreja. Participe conosco!

Medoro, irmão menor-padre pecador

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