“A entrega voluntária é um ato de amor. Eu cuidei da criança do jeito que eu podia”. A declaração é de Joana (nome fictício), de 42 anos, que teve um bebê em dezembro do ano passado. Ela conta que decidiu pela entrega voluntária para adoção no dia em que descobriu a gravidez.
“A gravidez foi uma surpresa. Eu não queria ser mãe, já sabia que seria demitida do emprego porque a empresa não ia bem, eu não tinha um companheiro fixo e morava sozinha. Como sou completamente contra o aborto, pelas minhas convicções religiosas, decidi pela entrega para adoção. Tive apoio dos amigos e do pai da criança nesse processo”, explicou.
“Eu não conhecia até então a entrega voluntária, me informei sobre o processo burocrático, busquei terapia e fui acolhida pela equipe da Vara da Infância. O atendimento foi muito humano, a recepção foi muito tranquilizadora. A assistente social me informou como seria o processo para a criança e o quanto é criteriosa a seleção para pais adotivos, o que me deu tranquilidade”.
Joana conta como foi a gravidez e o parto: “Tive todo um acompanhamento durante a gestação. Tive um parto na rede particular, pelo plano de saúde. O hospital foi informado pela Vara e o atendimento foi muito bom. Não houve nenhum olhar estranho para mim. Hoje estou feliz pelo processo simples, que foi o evento mais importante da minha vida”.
“A entrega voluntária, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que completou 34 anos no último dia 13, é uma entrega protegida da criança para a adoção”, destacou o juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, da 4ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital.
O magistrado explicou o processo que tem início com a manifestação da vontade dos pais, ou somente da mãe: “A vontade de fazer a entrega para a adoção é comunicada ao juízo da vara com competência em infância e juventude. A equipe técnica do juízo faz o atendimento da mãe, mesmo antes do nascimento da criança. Após o nascimento, a equipe ouve novamente essa mãe. É designada uma audiência na qual estarão presentes o juiz, o representante do Ministério Público e um defensor público ou advogado da mãe. Nessa audiência, ninguém tentará convencer a mãe a não entregar a criança. O objetivo é saber se a decisão é madura. A partir daí, existe um prazo de desistência de dez dias. No décimo primeiro dia, é chamado o primeiro casal ou pessoa habilitada que esteja no Sistema Nacional de Adoção para realizar a aproximação com a criança. É dada ainda a oportunidade de a mãe registrar, na ata da audiência, uma mensagem para o bebê, porque esse filho tem o direito de conhecer as origens e terá acesso ao processo no futuro”.
O juiz esclareceu também que, independentemente de deixar essa mensagem, a mãe pode optar por manter sigilo sobre a entrega voluntária, inclusive em relação aos próprios familiares. Se ela não quiser que ninguém da família seja procurado para assumir a guarda da criança, ela pode exigir o sigilo. “Não existe nenhuma razão para se fazer uma entrega direta, irregular ou abandonar a criança, uma vez que o ECA prevê a possibilidade de a mãe exigir o sigilo na entrega”, destacou o juiz.
Sete meses depois de decidir pela entrega voluntária, Joana deixa um recado para as mulheres que passam pela mesma situação: “Procurem ajuda da família, dos amigos. Mesmo que se sintam sozinhas no mundo, saibam que a Justiça não te desampara. Nós não precisamos passar por isso sozinhas. A solução não é abandonar a criança na rua ou entregar ilegalmente para qualquer família. Existe uma fila imensa de pessoas à espera de uma adoção. Tem muita gente disposta a dar muito amor para essa criança”.
“Entregar de Forma Legal é Proteger”
Joana foi uma das mulheres atendidas pelo projeto da Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infâncias, da Juventude e do Idoso (CEVIJ) do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ). “Entregar de Forma Legal é Proteger” tem como objetivo conscientizar a sociedade, no que tange a entrega de crianças por parte de seus genitores à Justiça da Infância e Juventude, com auxílio de assistentes sociais, profissionais de saúde e outros órgãos do Sistema de Proteção à Infância.
Dados do painel de acompanhamento do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento do CNJ indicam que foram 75 entregas voluntárias no Estado do Rio de Janeiro em 2023. Este ano, até 17 de julho, foram registradas 41. No Brasil, há 35.982 pretendentes à adoção disponíveis, sendo 3.167 no Estado do Rio. Departamento de Comunicação Interna TJRJ
Imagem: Reprodução
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