Ministro do STJ debate reconhecimento de pessoas em palestra na DPRJ



Com objetivo de debater a Resolução 484 do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece diretrizes para prevenir que pessoas sejam presas injustamente por conta de falhas no reconhecimento fotográfico em processos criminais, a Defensoria Pública do Rio recebeu, na manhã da última sexta-feira (10), o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogério Schietti Cruz.

O evento aconteceu no auditório da sede da DPRJ e reuniu defensoras(es), juristas e membros da sociedade civil para discutir a questão.

Aprovada pelo CNJ em dezembro de 2022, a resolução foi fruto de um Grupo de Trabalho coordenado pelo ministro que contou com a participação de 41 especialistas no tema, entre eles, quatro defensoras e defensores públicos do Rio.

Durante a palestra, Schietti parabenizou a Defensoria por sua atuação e reiterou que a Instituição tem um papel muito grande não só na consolidação das novas práticas mas também um dever de buscar a reparação para as pessoas que foram vítimas desse erro.

"Quando prendemos um inocente, cometemos um erro duplo: prendemos uma pessoa que não cometeu um crime e deixamos solto o verdadeiro culpado. Eu considero isso um erro duplo com a sociedade como um todo. Que sejam feitas boas provas para evitar alguém impune por uma conduta e um inocente condenado", disse.

Neste sentido, o ministro também reforçou que a Defensoria deve zelar para que as delegacias de polícia não sejam locais indutores de novos atos de reconhecimento pelos famigerados álbuns de suspeitos, pois eles representam um perigo muito grande para que pessoas inocentes sejam condenadas.

"Essa resolução é fruto da ciência e uma interseção na construção do direito. Estamos dizendo para os juízes que os critérios que podem ser julgados a partir de uma prova substancial, não podem ser únicos. Mesmo que o reconhecimento fotográfico seja bem feito, ele não basta para ser condenatório, pois ainda assim, estaremos sujeitos a falsas memórias", completou o Ministro.


Já a coordenadora de Defesa Criminal da DPRJ, Lucia Helena de Oliveira, reiterou que a resolução é histórica e demonstra que o Judiciário, bem como outros atores do Sistema de Justiça estão preocupados e sensibilizados com os erros em casos de reconhecimentos de pessoas.

"A resolução ajudará a diminuir as injustiças, condenações por erro e certamente contribuirá muito para a redução da seletividade penal, que atingem em grande maioria inocentes jovens, negros e periféricos", destaca Oliveira.

Em seguida, a coordenadora agradeceu a presença de Alberto Meirelles Júnior, que em 2019 foi preso por conta de falhas no reconhecimento fotográfico e com a ajuda da Defensoria, conseguiu provar a sua inocência.

"Machuca muito pagar por um erro que eu não cometi. Preto no Brasil, infelizmente, vai ser sempre discriminado e acusado dessas coisas. Espero que a resolução evite que as pessoas passem pelo mesmo que", disse Alberto.

Lívia Casseres, coordenadora de Promoção da Equidade Racial da Defensoria do Rio afirma que a vivência criminológica brasileira mostra o papel dos estereótipos raciais nos processos de criminalização.

"Nós sabemos que o suspeito nos países periféricos na América Latina, nos países que foram alvo de colonização, a figura do suspeito está muito ligada ao corpo negro. Isso se reflete nos álbuns de suspeitos das delegacias policiais. Temos ali uma representação desproporcional de fotografias negras, não apenas porque essas pessoas são mais criminalizadas pelo estado brasileiro, mas porque essas pessoas carregam esse estereótipo e estigma de suspeito", define a coordenadora.

Também estiveram presentes no evento a defensora pública-geral, Patrícia Cardoso; a corregedora-geral, Kátia Varela; a subcoordenadora da Promoção da Equidade Racial, Daniele Silva; além do coordenador do Núcleo de Investigação Defensiva, Denis Sampaio.


Entenda os parâmetros da Resolução

Entre os principais aspectos da resolução, destacam-se a delimitação do reconhecimento de pessoas como prova irrepetível e o estabelecimento de que o reconhecimento seja realizado preferencialmente pelo alinhamento presencial de quatro pessoas e, em caso de impossibilidade, pela apresentação de quatro fotografias, observadas, em qualquer caso, as diretrizes da resolução e do Código de Processo Penal.

A norma também prevê que, na impossibilidade de realização do reconhecimento conforme esses parâmetros, outros meios de prova devem ser priorizados.

Além disso, todo o procedimento de reconhecimento deve ser gravado e disponibilizado às partes, havendo solicitação.

Também é necessária a investigação prévia para colheita de indícios de participação da pessoa investigada no delito antes de submetê-la a procedimento de reconhecimento e, ainda, a coleta de autodeclaração racial dos reconhecedores e dos investigados ou processados, a fim de permitir à autoridade policial e ao juiz a adequada valoração da prova, considerando o efeito racial cruzado.

A resolução prevê que a autoridade deve zelar pela higidez do procedimento, evitando a apresentação isolada da pessoa, de sua fotografia ou imagem (show up), o emprego de álbuns de suspeitos e de fotografias extraídas de redes sociais ou de qualquer outro meio, além de cuidar para que a pessoa convidada a realizar o reconhecimento não seja induzida ou sugestionada, garantindo-se a ausência de informações prévias, insinuações ou reforço das respostas por ela apresentadas.

Ascom DPRJ/ Texto: Jéssica Lealfull-width

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