Infecção urinária em paraparéticos: conhecimento, contaminação, tratamento e processo de cura

São considerados paraperéticos todos os indivíduos usuários de cadeiras de rodas, com sequelas de lesão cerebral traumática incapacitante do ponto de vista funcional.

A paraparesia adquirida com toda sua gama de repercussões corporais e emocionais causam um abalo à constituição subjetiva do corpo das pessoas por ela afetadas, requerendo dos profissionais de saúde, particularmente enfermeiros de reabilitação, empenho na busca de conhecimentos sobre o quanto uma mudança na imagem corporal significativa pode influenciar a vida dessas pessoas.

O que requer adoção de estratégias terapêuticas integradas à equipe reabilitadora, focadas no despertar sua resiliência, autoestima e determinação, condições indeclináveis ao processo de reabilitação de longo prazo e ser gradualmente trilhado.

A espasticidade, como resposta neurológica da lesão cerebral incapacitante é caracterizado pelo englobamento da distonia espástica e encurtamento muscular comum da síndrome do neurônio motor superior, podendo impactar negativamente a qualidade devida em pessoas com histórico de acidente vascular cerebral, traumatismo cranioencefálico, paralisia cerebral, esclerose múltipla, entre outros danos ao sistema nervoso central.

O acompanhamento do quadro de evolução pessoas com lesão neurológica incapacitante, como paraparesia espástica severa, deve ser contínuo, ainda que elas tenham adquirido maior independência para as atividades de vida diária, pois precisam de avaliações regulares de longo prazo na reabilitação física.

Esse acompanhamento institucional ocorre para avaliação periódica dos segmentos e funções corporais e suas possíveis complicações, assim como dos demais sistemas passíveis de alterações em seu funcionamento em decorrência da lesão neurológica incapacitante.

A infecção do trato urinário, por sua vez, é uma das principais infecções relacionadas à assistência à saúde.

Pode estar associada, sobretudo, à inadequação no manuseio asséptico, ao prolongamento do tempo de uso do cateter, à indicação inadequada e à colonização bacteriana indesejada, além de complicações do trato urinário e bexiga, mesmo em quem tenha preservado suas micções voluntárias, no decorrer de 29 anos em cadeira de rodas.

Após essencialexplanação conceitual do tema, vamos ao que mais relevante se apresenta. Ao receber visita da equipe médica para detalhamento sobre o procedimento de cifoplastia, vantagens e riscos cirúrgicos, questionei eventual necessidade de cateterismo vesical relacionado ao possível acúmulo de urina causado pelo fluxo contínuo de líquido via venosa.

Por excesso de zelo e tentando minimizar riscos de uma infecção urinária, o cirurgião argumentou que o tempo estimado para conclusão do procedimento, geralmente, era inferior à capacidade de acúmulo da bexiga, agendando a intervenção para uma tarde do mês de junho de 2022.

Porém, a cirurgia do cliente que me antecedeu foi mais longa e um cateterismo vesical se fez indispensável e foi realizado. Nada a estranhar, pois todo hospital geral segue regras protocolares de prioridade aos casos mais graves.

Constatei poucas semanas após alta hospitalar, uma ardência uretral antes, durante e após as micções voluntárias e urina turva. Imediatamente, pensei na possibilidade de haver contraído infecção urinária.

Consultando médico que me atende, ele de imediato solicitou exame laboratorial de urina EAS e cultura.

Liberado resultado ficou evidenciada a infecção e deu-se início ao tratamento a base de antibióticos e recomendação de aumento na ingestão de líquidos, majoritariamente água. 

Por fim, na manhã do dia 12 de janeiro de 2023, coletei a primeira urina do dia e tive o prazer de constatar características normais de cor, transparência e odor. Mais uma etapa superada.

Resta terminar a última semana do esquema de antibioticoterapia adotado, posteriormente, solicitar e realizar novos exames de laboratório para certificar a presença ou ausência de colônias bacterianas e elementos anormais e sedimentos.

A experiência profissional de enfermeiro em vários hospitais públicos e privados do Rio de Janeiro, exercício da função docente de graduação e pós-graduação em saúde, desde os idos 1977, quase cinco décadas de muito trabalho e acesso ao conhecimento, sinto-me munido de credenciais acadêmicos para acompanhar e avaliar passo a passo desses adventos.

Cônscio de que essas contaminações do trato urinário por cepas bacterianas que habitam os ambientes das unidades hospitalares são pós-graduadas em estratégias de defesa aos efeitos terapêuticos dos antibióticos de primeira, segunda e terceira gerações, além de fortalecidas pelas adversidades no desdobramento dos protocolos nosocomiais, uso abusivo e inadequado desses medicamentos.

O processo de cura pode ser de longo prazo, particularmente, de pessoas que acumulam sete décadas de vida encarnada e com enfrentamentos diários diversos impostos pela paraparesia espástica adquirida. É fundamental que se detenha no lado positivo que os fatos nos apresentam.

A oportunidade dessas vivências concretas traz possibilidades de experimentar a dimensão semiótica da dor física, mental, emocional, espiritual e existencial de inúmeros seres humanos que prestamos cuidados, acolhemos, emprestamos nossos ouvidos e doamos boa parte das nossas vidas, dedicados ao exercício do servir na mais bela das artes, a Enfermagem.

Por Professor Dr Wiliam Machado

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