Menino de Rua

O dia nublado mistura-se aos voos rasos das gaivotas.

O rio corre por entre as pontes.

Não distante dali – centro urbano.

Labirinto de concreto.

Reflexo de um mundo abstrato.

No chão cacos, garrafas, latas e bingas de cigarros.

O retrato cinza tornou-se a moradia perfeita para as baratas e ratos.

Existem coisas que boa parte das pessoas pouco se importam.

Indivíduos cada vez mais automatizados, acostumados com o dissabor e a não olhar para os lados.


Próximo aos carros ele é por mim observado.

Fito o olhar nele.

O menino de rua está sentado na calçada degradada.

Pés descalços, sujos e calejados.

Percebo feridas abertas pelo tempo em que os mesmos tocam o chão, sem ao menos um chinelo para mínima proteção.

Entristeço, emudeço.


O menino de rua possui aspecto apático.

Os ossos diante de meus entristecidos olhos apresentam a figura de um menino desnutrido, evasivo e mergulhado em seus próprios vazios.

As unhas das mãos calejadas estão sujas e compridas.

Mãos que procuram algum gesto em meio a um no cenário de tanta desolação.

O dedo mindinho esquerdo não acompanha o ritmo lento dos demais, pelo fato do menino ter caído e se cortado com uma garrafa de cachaça que comprara a pedido da mãe embriagada.


O vi tentando vender algumas balas e pedindo esmolas.

Contendo as lágrimas salgadas que transbordavam, apresentei-me a ele e perguntei:

– Menino qual é o seu nome?

– João.

– Solta pipa?

– Não, não posso.

– Gosta de futebol?

– Não, não posso.

– Você brinca?

– Não. Não tenho tempo para essas coisas.

– Mas por quê?

– Porque não posso.

– Mora sozinho por estas ruas frias e perigosas?

– Não. Tenho pais, avós e irmãos. Mas me sinto sozinho...

– Quantos anos você tem?

– Não posso falar.

– Por quê?

– Porque não posso! Sou muito novo para estar aqui, e ser novo pode ser perigoso.

– Perigoso?

– Sim!

– Entendo.

– Você gosta de ser criança João?

– Não posso, mas tenho um pouco de esperança.


Aparentemente frágil, o menino se levanta e parte em direção aos carros.

Algo no meu âmago inflama!

O desconforto expande e chama!

– Espere! Eu posso te ajudar. Espere um pouco.

– Não, não posso.

– Por que não?

– Porque não moço!

– Por que tantos nãos?...

– Não sei, a minha vida inteira tem sido nãos.

Por Jhean Garcia
Imagem: Pixabay

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