Um brinde ao responsável por tudo

Meu pai. Que pessoa diferenciada. Filho de um humilde telegrafista, que se tornou herói por ser o último a largar seu posto enquanto seu navio, o Uberaba, afundava, e salvou muita gente, quando nos demos por gente, ele ouvia óperas.

Não conheci ninguém na minha vida que ouvia óperas.

A cavalaria Rusticana. O Fantasma da Ópera. Em meio aos Ataulfo Alves, Noite Ilustrada, sambas que se ouviam do seu quarto, trouxe a Barsa, para aprendermos as palavras, e nos levou a colecionar os Gênios da Pintura...e crescemos em meio a muita arte. De quebra nossa mãe tocava as valsas de Strauss no piano da sala.

E que pai é esse que tinha uma Divina Comédia, de Dante Alighieri, a oferecer aos filhos, ao lado das fábulas de La Fontaine?

Era moda ensinar filhos a poupar. Colocar moedas no cofre. Ele, nos inspirava a retirar livros e discos da estante sem parar.

De onde se inspiraram, só Jesus!

Segundo Osvaldo Canelas, a enciclopédia do nosso futebol, foi, ao lado do Fabinho, de Paraíba do Sul, o maior jogador de futebol amador de toda nossa região.

Em meio a acirrada rivalidade entre o América, dos seus pais, e o Entrerriense, do pai da sua amada, para casar precisou vestir a camisa carijó. E acabou agregando a beleza da Dona Janet, modéstia à parte, ao talento dos que colocou no mundo.

Beleza interior, quem sabe, no nosso caso.

Todos jogamos bola, criamos um bloco de carnaval, escrevemos livros e amamos grandes mulheres como fez por nos ensinar. Um bom vinho e uma cerveja gelada sempre esteve no cardápio que servia quando nos reunia.

Que orgulho, seu Zé Roberto, da sua passagem por aqui. Aos 96 anos, dono de uma lucidez impressionante, deu entrada, ontem, no CTI.

Meus irmãos estão chegando. Tem algo no ar, e nos ciclo da vida, nos preparando para uma despedida. Poucos viverem tão intensamente esta vida como ele.

Só nos resta esperar que seja feita a vontade de quem criou um cara tão bacana. Vamos aguardar se volta para casa, e nos dar outra lição, ou se vai encontrar nossa mãe.

Com muito orgulho, respeito e admiração, o nosso herói, que nos retirou da mesmice, nos ensinou caminhos cercados de arte, samba e alegria, merece um final sem dores, à altura dos seus amores. Do emocionante enredo que viveu e escreveu para todos nós.

Nós te amamos, seu Zé!

Sua paixão eterna

Nosso pai descansou. Missão cumprida.

Trouxe sua bandeira de luta, seu escudo no campo, uma das suas maiores motivações na vida.

 
América FC. Foi seu meia esquerda, torcedor, benemérito, presidente. Em seu mandato, enxergou que 288 famílias teriam o direito de ocupar um conjunto habitacional no centro da cidade.

No lugar de um campo de futebol.

E levou o estádio e sua sede para o Bairro do Purys.

Flamengo e Fluminense levaram décadas para perceber isso.

Estamos recebendo não apenas a solidariedade dos amigos. Mas palavras carinhosas de reconhecimento à sua obra que dá, aos seus filhos, orgulho e a certeza de um dever mais do que cumprido.

Obrigado, meu pai.

Por José Roberto Padilha

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