Com açúcar e com afeto, de tricolor para tricolor
Nem preciso dizer da admiração política e musical que tenho por você. Desde que nos convidou para ver a banda passar, ainda adolescente, nossa admiração só tem subido por paredes sólidas junto a todas as suas construções literárias.
Você sempre foi meu ídolo. E lembro muito do dia em que você confessou, a um repórter que cobria o Fluminense, que admirava o meu futebol. Quanta honra!
Foi em 1975, quando jogava na Máquina Tricolor. Era uma oportunidade de conhecê-lo pessoalmente. Mas o nosso time, que pena, passou e permaneceu na história junto com a sua banda. E nunca nos conhecemos, para azar dos meus 15 minutos de fama.
Hoje eu li, com pesar, que você não vai mais cantar uma das suas pérolas porque ela traz versos que desagradaram o movimento feminino. Para mim, soou como um drible do Pelé que as tevês não vão mais reprisar porque a Fifa passou a considerar um "deboche" ao adversário.
Novos tempos, pobres tempos. Se a Nara abriu os braços e perdoou seu amor por passar o dia no boteco, com açúcar e com afeto, é porque esse era o retrato dos anos em que ela foi composta.
Minha mãe foi Nara também. Perdoava seu Zé cheirando a Whisky ao voltar pra casa tarde "do plantão". Avanços sociais, conquistas das minorias. Você sabe, quem sou eu, só alcançaram direitos porque são retratos coloridos do seu tempo.
Retratos em preto e branco não devem se tornar coloridos. São espelhos d'alma. Com seus olhos tristes, você bem que mostrou para a Nara que o tempo passou na janela e só Carolina não viu.
Não tire a canção do seu repertório. Uma obra genial como a sua não merece ser revista nem pelo próprio Chico de agora.
Saudações tricolores e sabe de uma coisa? O mundo está chato pra carvalho.
Coluna José Roberto Padilha
Imagem: Divulgação
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