A cara bacana do futebol


Em meio ao mundo que orbita em torno dos jogadores de futebol, entre eles, o Corretor de Imóveis de plantão, para buscar a entrada do primeiro contrato, a Maria Chuteira, de prontidão, para levá-lo para a noite, e esquecer a namorada da era amadora, se encontram os novos amigos que os amam de verdade. O futebol e seus jogadores.

Em meio ao crescimento do futebol de Três Rios, que em 1992 colocou seus dois clubes, o América FC e o Entrerriense FC, na primeira divisão estadual, e hospedou craques como Delei, Mário Marques, Índio, Adílio e César Diniz, um personagem se tornou o parceiro fiel de todo mundo.

Marcos Badá, e a padaria, de sua família, passou a ser a referência, o ponto de encontro da boleirada. Bem localizada, perto de tudo, foi se tornando a nova Boca Maldita, nas derrotas, e o Point da Alegria, nas vitórias.

Só dava Badá. O nosso embaixador carregado de gentileza, simpatia e, principalmente, bom humor, foi quem traduziu nossa tradição e nobreza no esporte aos que passariam a defender o nome de nossa cidade.

Certo sábado, dava aulas em nossa escolinha de futebol quando o Badá passou por lá. À tarde seria inaugurado o Estádio Raulino de Oliveira. Estava sem carro e fez o convite: "Vamos?". Ficara sabendo que a preliminar seria entre o Master do Flamengo x Master do Voltaço, às 15h00, e na partida principal, Volta Redonda x Botafogo.

Atuara em algumas partidas pelo master rubro-negro, mas para aquela, especial de inauguração, não havia sido convidado.

E se tem algo que carrego junto é o tal aparelho de desconfiômetro. Ele indicara para ficar quieto em Três Rios. E como convencer o Badá? Daí a patroa achou uma boa ideia ficar no Sider Shopping enquanto tentávamos entrar no estádio. E embarcamos todos pela BR-393.

"Leva a chuteira, Zé. quem não força, não joga"", parafraseou Neumar Candido, o Tatão. Para não contrariá-lo, levei a minha escondida na mochila.

Vocês já foram a uma inauguração de um estádio de futebol no Brasil? Pois é, tal é a desorganização que ninguém conhece o porteiro, que não foi apresentado aos guardas municipais, que por sua vez não foram apresentados ao administrador geral.

E os torcedores chegando junto aos curiosos e uma pequena confusão logo se instala.

Desatento só não estava o Badá. Percebendo a equipe principal do Botafogo descendo do ônibus, gritou: "Vágner! Sérgio Manoel! Por aqui. Venham comigo". e toda a delegação, e eu no bolo, o seguimos até um acesso aos vestiários. Foi se apresentando ao porteiro, dando ordens, entre elas: "Zé Roberto, aqui comigo!". E seguimos todos aquele maluco corredores adentro.

No primeiro vestiário, dava para ver da porta entreaberta os jogadores do Flamengo trocando a roupa. E ele entrou e falou em voz alta: "Gente, o Zé Roberto, chegou!" Tão sem graça, encostei na parede ocultando a mochila, e pressionava contra as costas a chuteira para que ninguém a visse.

Foram os cinco minutos mais constrangedores da minha vida esportiva. Jamais havia forçado algo parecido. De repente, Jesus. Desculpe, quase, Junior vem em minha direção e joga um tubo de oxigênio sobre um corpo combalido: "Zé, se importa em jogar o segundo tempo! Ainda vou pro Rio comentar o jogo da Globo!".

Ufa!

Sentadinho todo feliz no banco, vejo Badá, já respeitado, admirado, quem seria aquele Agente FiFA, deveriam pensar, se aproximar do gramado e em meio a um raro passe errado do Junior, dá um grito que soou por todo o estádio ainda vazio: "Volta Júnior! Caralho, assim não dá!"

Junior olhou pro banco. Nem Telê Santana havia lhe chamado a atenção daquele jeito. Porém, cavalheiro, voltou trotando, e o banco ficou a admirar ainda mais aquele senhor estranho que chegou do nada e se meteu em tudo.

Não acabou aí. Recebemos após as partidas um lindo kit com camisas e lembrancinhas alusivas àquele dia histórico. E ainda fui convocado a receber uma das cotas de 500 pratas destinadas aos jogadores (que o Capitão , Jaime de Almeida, pegou o numero da minha conta e perdeu). Esqueçam, já prescreveu.

Fim de jogo, fomos pegar a Rossana no shopping e ela perguntou: "Conseguiram entrar?"

Fomos todos para um clube social que tinha uma enorme buffet, musica ao vivo e discurso do prefeito. Ela nem acreditou.

Que pela manhã, dando aulas de futebol para as novas gerações, estávamos longe de imaginar viver uma tarde/noite daquelas.

Porque jogador, até a gente consegue revelar, mas personagens exóticos, divertidos, espirituosos e ousados, como o Marcos Badá, pegaram a receita e jogaram fora.

* Texto do livro "Crônicas de um jogador", de 2009, reeditado para homenagear nosso grande e inesquecível amigo.

Por José Roberto Padilha
Imagem: Reprodução

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